
Marejados estavam os olhos de Sofia, enquanto deitada na maca de um hospital, vozes se passavam ao fundo. Vez ou outra algum profissional vinha checar seus sinais vitais - alguns em silêncio, outros com ar de compadecimento e outros questionando em alto e bom tom sobre o motivo de terem de perder tempo com uma bobagem dessa enquanto tinham tanto trabalho a fazer e tanta gente doente lutando pela vida para cuidar.
Qualquer que fosse a expressão das pessoas ao seu redor, Sofia não esboçava raiva, felicidade, incômodo ou gratidão; era torpor, como se naquele momento as horas já não passassem, os afetos já não lhe atingissem e as escolhas já não importassem. E por falar em escolha, qual foi a escolha de Sofia? Que vivência sombria a assolava a ponto de abrir mão da existência de si mesma?
Na volta para casa, os pais da jovem questionavam a si mesmos sobre onde teriam errado, ao mesmo tempo em que tentavam expurgar-se da intensa e dolorosa culpa. Os vizinhos, indignados, fuxicavam sobre o ato a que chamavam de egoísta. Curiosos ansiavam por detalhes, procurando alguma ninharia que se pudesse postar nas redes sociais. E quanto a Sofia? Bem, ninguém quis saber os seus motivos, importava apenas que não se repetisse.
Qual foi a tua escolha, Sofia? Quais foram os teus caminhos e as tuas dores? Tuas alegrias e teus dissabores? Ninguém percebeu que Sofia sofria. Calaste tanto a tua voz que não pudeste gritar? Foste demasiada sutil nos sinais ou os outros que não quiseram enxergar? O fato é que Sofia sofria e tamanho foi seu desalento que converteu-se em tormento e mais uma vez a jovem donzela resolveu dar seu fim, mas, dessa vez, sem um príncipe para salvá-la.